Desde cedo que as crianças e jovens autistas referem ser alvos fáceis e igualmente fácil incriminados e incompreendidos. Os pais corroboram esta ideia acrescentando a sua maior ingenuidade e dificuldade na leitura de algumas situações sociais. Os professores vêm-se frequentemente a braços com situações que têm dificuldade em lidar. Cada vez mais frequentemente o INEM, PSP ou GNR são chamados às escolas para intervir em situações mais conflituosas. Mas também há pais de autistas que necessitam de recorrer às mesmas soluções quando já parecem não conseguir conter certas situações. Afinal o que se passa?!
Já não é a primeira condição psiquiátrica que se pensa associada ao comportamento criminal e ou agressivo. Quantas vezes as pessoas se perguntaram se alguém esquizofrénico não é perigoso ou agressivo? Ou pessoas que observaram determinado comportamento de crianças e jovens autistas, normalmente caracterizados por uma maior agitação psicomotora e deram dois passos atrás com o intuito de se protegerem. Pais e professores já reportaram situações em que tentaram fazer contenção física de crianças e jovens autistas e acabaram por ser agredidos! Afinal os autistas são agressivos ou violentos? A resposta é rápida - NÃO!
Outros exemplos reportados passam por furto de dinheiro ou uso indevido de cartões multibanco e ou crédito para fins pessoais. Seja para comprar sacos de gomas para distribuir aos colegas na escola ou porque determinado colega pediu a outro, neste caso autista, para lhe emprestar determinada soma de dinheiro. Mas também no caso de jovens que desejam obter determinado videojogo ou melhorar determinadas características num jogo já adquirido. Em situações académicas é comum haver situações de plágio em que os próprios parecem não apresentar consciência critica acerca do seu comportamento. Mas também situações de queixas de assédio sexual em contexto de trabalho. Por exemplo, dois colegas que mantêm contacto frequente dentro e fora do trabalho. E em que um deles é autista, e que acaba por cometer determinada incorreção, seja pelo envio de um sms ou de uma frase ou atitude, porque compreendeu algumas pistas da sua colega como sendo característica de outra coisa.
Estes e outros exemplos, levam crianças, jovens e adultos autistas a terem desde cedo um contacto mais próximo com o sistema judicial e criminal. Na infância existe a Lei tutelar educativa e que prevê um conjunto de medidas para a criança e família. Mas do ponto de vista informal são muitas as situações em que a família é convidada ou pressionada a abandonar a escola. A partir de determinada idade as medidas, tutelares e outras passam a ter uma maior expressão e gravidade, nomeadamente nas penas atribuídas. Os comportamentos que se verificam também apresentam uma expressão mais difusa e grave e levam a que todos fiquem bastante assustados e sem saber muito bem como responder nestas situações. A partir da maioridade o autista passa a ser vista como pessoa adulta e a ser considerado dentro do sistema judicial e criminal à luz do código penal vigente. Não vou entrar em mais detalhes até porque não tenho competência para tal e a minha área de formação não é Direito.
Em Portugal ainda existe muito pouco o hábito de falar acerca desta interligação entre o autismo e o comportamento criminal mas em outros países, até pelo próprio desenvolvimento do conhecimento cientifico na área do autismo, moldura penal e judicial existente e a ocorrência de um número maior de casos, já se investiga e publica muito acerca do tópico. Nomeadamente, alguns trabalhos falam da existência de um número significativo de casos, mulheres e homens, que se encontram a cumprir pena de prisão e que apenas nessa altura é que são diagnosticados com autismo.
Os autistas são mais propensas a serem vítimas e testemunhas de crimes do que criminosos. Experimentam dificuldades na comunicação e interação social e imaginação social. Podem ter dificuldades sensoriais e alguns problemas de coordenação. O seu comportamento pode parecer estranho e às vezes chamar atenção desnecessária, mas, em geral, o autismo é uma condição oculta e pode não ser imediatamente óbvia para outras pessoas que a pessoa a têm.
Quando pessoas autistas cometem determinadas ofensas, e que podem ser pelas seguintes razões.a) Ingenuidade social. O desejo de ter amigos levou algumas pessoas autistas a fazerem amizade com criminosos e a se tornarem seus cúmplices involuntários. As pessoas no espectro do autismo geralmente não entendem os motivos de outras pessoas; b) Dificuldade com mudanças ou eventos inesperados. Uma mudança inesperada no ambiente ou na rotina, por exemplo, um atraso no transporte público, pode causar grande ansiedade e angústia, levando a comportamentos agressivos; c) Incompreensão das pistas sociais. Por exemplo, muitas pessoas autistas têm dificuldades com o contacto visual, o que pode ser evitado, fugaz, prolongado ou inadequado. Isso pode ser interpretado como fazendo avanços sexuais indesejados; d) Adesão rígida às regras. Eles podem ficar extremamente agitados se outras pessoas violarem essas regras. Por exemplo, um homem autista era conhecido por chutar carros estacionados ilegalmente; e) Não entendendo as implicações de seu comportamento. Devido a dificuldades com a imaginação social, uma pessoa autista pode não aprender com a experiência passada. Eles podem ofender repetidamente se não oferecerem o apoio e a intervenção corretos.
Estes e outros exemplos devem-nos levar a reflectir sobre este fenómeno. É verdade que no autismo há muito para reflectir e compreender. No entanto este fenómeno tem um impacto bastante grande e grave na vida do próprio e que o leva a um afastamento mais ou menos temporário da sociedade sem que o próprio tenha compreensão do que aconteceu. Para alem de todo o sofrimento adicional e aumentado sentido em contexto prisional.
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