O direito a amar
- pedrorodrigues
- há 26 minutos
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Na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adoptada por Portugal em 13 de dezembro de 2006, é considerado o direito às pessoas com deficiência a terem relações românticas.
Confesso que a primeira vez que li esta frase senti um arrepio. Na verdade, mais do que um arrepio. Quem somos nós para considerar o direito de quem quer que seja a ter relações românticas, para além das nossas próprias relações? Mas à medida que fui entrando no mundo das pessoas com deficiência fui percebendo mais e mais a ideia de muitas pessoas, familiares, profissionais de saúde, e sociedade em geral, que têm acerca da possibilidade de pessoas com deficiência terem relações românticas. E quase de imediato, aquele arrepio inicial passou a ser outra coisa e aceite como necessário. Além disso, ao olhar para a data - 2006, faz pensar na quantidade de tempo necessário para as pessoas sem deficiência terem demorado a pensar na importância de algo tão vital para qualquer um de nós.
Pensar que o facto de uma pessoa poder ter desafios no estabelecimento de uma relação romântica, não pode constituir o direito de nos arreigarmos de definir propostas para o estabelecimento de relações românticas, neste caso em pessoas com deficiência.
As pessoas com dificuldades de aprendizagem desejam desenvolver e manter relações íntimas como todas as outras pessoas, mas muitas vezes enfrentam barreiras para exercer este direito humano fundamental. Todos têm o direito de desenvolver e experimentar relações íntimas, que são uma parte importante das relações pessoais e incluem tanto as relações românticas como as sexuais.
A forma de pensarmos sobre as relações, sejam elas interpessoais, românticas ou sexuais, leva a todos nós à criação de determinadas crenças que fortificam barreiras de entendimento entre uns e outros e que são causadoras de grande mal estar psicológico.
Seja porque os pais, investidos do papel de educadores e protectores dos seus filhos, procuram adiar até já não ser mais possível, abordar as relações, principalmente as românticas e sexuais com os seus filhos. Leva a que estes últimos fiquem totalmente desprotegidos de informação que lhes possa assegurar entrar no mundo das relações de uma forma segura e confiante. Até porque a Escola continua a ter uma perspectiva semelhante sobre o ensino da relações nas pessoas com deficiência. E como tal, as pessoas com deficiência ficam, mais do que quaisquer outras, desprovidas de uma base segura e confiante para avançar naquilo que é um direito seu, e que sentem igual desejo de o fazer.
Mas também é preciso olhar para aquilo que são os programas promotores de uma melhor saúde sexual nas pessoas com deficiência. Vários destes programas encontram-se desfasados daquilo que é a realidade de muitas pessoas com deficiência. E isto principalmente ocorre porque estes programas são construídos sem a participação dos principais visados neste processo. Mais uma vez, as pessoas sem deficiência, arreigam-se de saber como é e deve ser a saúde sexual das pessoas, sejam elas sem ou com deficiência e promulgam, à semelhança da convenção das pessoas com deficiência, aquilo que deve constar nestes programas.
Além do mais precisamos de continuar a olhar para todo o espectro das pessoas com deficiência e pensar que existem níveis e perfis de funcionamento diferentes. E que como tal necessitam de respostas adaptadas. Mas ainda assim, não deixando de olhar para a importância das relações românticas e sexuais.
O comportamento humano não muda por decreto-lei, ouvimos muitas vezes dizer. Pois bem, as relações românticas não se convencionam ou determinam por programas. As pessoas com deficiência precisam de um espaço seguro para se encontrar, a si próprias e ao Outro. As pessoas com deficiência precisa de um espaço seguro e que transmita segurança, para que sintam motivação para avançar neste caminho de auto-conhecimento e do Outro. As pessoas com deficiência precisam de um espaço onde possam ser elas próprias. E esse espaço é um lugar onde todos nós existimos, sem que uns ou outros determinem ser seu. O espaço de existência de cada um de nós é próprio e único, e por conseguinte é o seu espaço. Mas este seu espaço existe num lugar comum e que precisa de ser respeitado por todos.

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