top of page

Desmascarar a máscara

Dia 4 de março é terça-feira de carnaval. Ninguém levará a mal se ao invés de falar sobre máscaras e folias, reflectir sobre as máscaras que várias pessoas autistas usam. E o que é que essas mesmas máscaras e o processo de camuflagem social podem querer significar para as pessoas autistas, mas também para aquilo que é a representação mental do autismo.


A camuflagem social é um conjunto de comportamentos utilizados por pessoas autistas para esconder certas diferenças sociais, para aderir a normas sociais neurotípicas, e serem integrados na Sociedade.


Face a esta breve definição, muitos poderão dizer que este conjunto de comportamentos não é somente usado por pessoas autistas, o que na verdade corresponde à verdade. Se pensarmos, em vários momentos da nossa vida podemos usar mais ou menos estes comportamentos para nos conseguirmos integrar e/ou esconder/camuflar algumas das diferenças sociais que sintamos apresentar. Contudo, esta atitude nas pessoas não autistas parece ocorrer com menor frequência e constância ao longo do tempo. Além das pessoas autistas, outras pessoas com diagnósticos psiquiátricos também vão recorrendo a esta estratégia, mais uma vez para esconder/camuflar certas diferenças sociais e se sentirem incluídos.


A primeira questão que sobressalta neste assunto prende-se com a necessidade de levar a cabo este comportamento de camuflagem social. E a ideia que aparece prende-se com os aspectos do estigma social face ao autismo e à saúde mental de uma forma global. Ora, se estas e outras características não fossem percepcionadas como negativas, não obstante a sua diferença, muito provavelmente as pessoas não sentiriam a necessidade de as camuflar.


Claro que tem sido importante investigar este fenómeno de camuflagem social nas pessoas autistas e no neurodesenvolvimento de uma forma geral. Assim, como tem sido fundamental perceber que quanto mais as pessoas autistas usam esta camuflagem social, mais parecem evidenciar um agravamento na sua sintomatologia ansiosa e depressiva. Até porque estarão mais frequentemente a usar recursos para procurarem fingir alguém que na verdade não são e não desejam ser, mas que procuram fazê-lo para se sentirem incluídos. E como tal, irão estar em várias situações, nomeadamente sociais, a terem comportamentos de hipervigilância para tentarem perceber se estarão a agir de uma forma correcta de acordo com a sua ideia de comportamento social camuflado. Comportamentos de hipervigilância esses que levarão necessariamente a um aumento de ansiedade. E o facto de estarem há tantos anos a procurarem ser alguém que não são e nem desejam ser, também se espera um resultado agravado da sua sintomatologia depressiva e com impacto negativo na sua identidade.


Claro que toda esta investigação é importante e necessária, mas continua a ser urgente investir mais na divulgação do que é o autismo e as suas diferentes expressões ao longo da vida junto da Sociedade em geral, mas também dos profissionais de saúde em particular. Até para ajudarmos a uma melhor representação mental do que é o autismo e a expressão variável e heterógena da pessoa autista. E que com isso, as pessoas autistas sintam maior confiança e à vontade de poder estar integradas e sentirem-se incluídas no tecido social.


Talvez este desmascarar a máscara possa ser posto em prática desde sempre, nomeadamente nos estabelecimentos de ensino e de uma forma universal. É urgente que as pessoas, começando nas crianças, que se possa procurar falar, trabalhar, brincar com aquilo que é a diferença e a (neuro)diversidade. O impacto que tem para todos nós,, sejam as pessoas autistas ou outras com outros diagnósticos, suas famílias, mas também para toda a Sociedade, que acaba por ter de suportar um aumento do orçamento para a protecção social e da saúde para as pessoas com estas e outras condições que ao invés de verem os seus quadros clínicos estabilizados, verificam o contrário.


Confesso que o que se tem observado ultimamente em Portugal e em outros lugares do Mundo me parece um retrocesso neste aspecto. A estigmatização da diferença, seja ela de que natureza for, parece estar a crescer e com isso os comportamentos de camuflagem social e outros tenderão a aumentar e por conseguimento o agravamento de alguns indicadores de saúde mental.


Costuma dizer-se que o Carnaval são três dias. Mas este carnaval parece durar há mais tempo do que isso e já é altura de desfilarmos de uma forma diferente.


 
 
 

Comentários


Informação útil:

Cadastre-se

©2018 by Autismo no Adulto. Proudly created with Wix.com

bottom of page