Confesso que já me perdi na versão em que o filme Fast and Furious vai. Mas também não é por isso que estou a partilhar este texto convosco. Mas gostaria de vos falar sobre algo que também segue em grande velocidade e que tem a ver com a avaliação do comprometimento funcional das pessoas adultas autistas. Avaliação essa que é fundamental tanto para o diagnóstico quanto para a abordagem terapêutica a seguir, nomeadamente nas pessoas com um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo nível 1.
Peço desculpa, estive a ouvi-lo com atenção mas não percebi o que é isso de nível 1?, pergunta-me Carlos (nome fictício). Após uma breve explicação dada ao Carlos. Mas eu não percebo é porque diz que o nível 1 é aquele com menor impacto, refere Carlos. Eu não vejo que o meu diagnóstico tenha assim tão pouco impacto na minha vida, continua. Percebo que os outros dois níveis que me explicam sejam mais negativos. Mas este nível 1 pode dar uma impressão errada às pessoas que tal como eu também não percebem grande coisa do autismo, compreende!? diz-me.
A gravidade do autismo pode variar muito e é baseada no grau em que a interação e comunicação social, a insistência na realização das mesmas atividades, e padrões repetitivos de comportamento afectam o funcionamento diário da pessoa. E é sempre importante relembrar que o próprio termo Espectro se refere a uma ampla gama de sintomas, competências e níveis de dificuldade no funcionamento das pessoas autistas. E podemos ter pessoas autistas adultas que permanecem como não verbais até aqueles que podem trabalhar e viver de forma independente.
Continuo a ouvi-lo com muita atenção. No entanto, pergunto-lhe o que é que eu preciso para viver uma vida de forma independente?, questiona-me Carlos. E será que preciso apenas de ser eu a mudar?, continua. E as outras pessoas não autistas? A quase totalidade das dificuldades que tenho tido na vida são com pessoas não autistas, percebe?, concluiu.
Um dos principais objetivos terapêuticos para as pessoas autistas é autonomia na idade adulta. Portanto, é fundamental poder haver uma ferramenta fácil de usar para a avaliação da situação da pessoa, até para ajudar a orientar o esforço terapêutico para a obtenção de melhores resultados. Há quem diga que o facto de ser feito uma avaliação ao perfil cognitivo e intelectual é suficiente para ajudar a determinar o nível de funcionalidade da pessoa autista na vida adulta. Contudo, quando falamos com os profissionais de saúde que trabalham junto das pessoas autistas com compromisso cognitivo, rapidamente nos dizem que as coisas não são assim tão lineares. E além disso os estudos que têm sido feitos comprovam essa experiência clinica.
Além disso, outros dirão que já existem alguns instrumentos e validados para fazer esse trabalho, nomeadamente a Vineland-II. E que é um facto. No entanto, parece importante continuar a tentar encontrar um instrumento que responda mais rapidamente a estas necessidades de avaliar e planear para intervir. Além do instrumento em si ser melhor adaptado para as situações em que se verifica compromisso cognitivo. É importante sublinhar a importância e validade da Vineland, mas parece igualmente fundamental encontrar um instrumento que avalie igualmente bem os níveis de funcionalidade na Perturbação do Espectro do Autismo nível 1.
Nomeadamente, poder haver em consideração nesta avaliação questões como, Autonomia, relacionada à capacidade de viver por conta própria, e de cuidar de si (e.g., aparência física, higiene, etc.); Funcionamento ocupacional, capacidade de obter e manter um emprego remunerado e ser eficiente nisso, sendo capaz de realizar estas competências no contexto real e para o qual a pessoa foi educada, ganhando de acordo com o nível da sua posição; Funcionamento cognitivo, sendo capaz de se concentrar durante a leitura ou um filme, resolver problemas, lembre-se dados simples e aprender novas informações; Questões financeiras, sendo capaz de administrar as suas próprias finanças; Relacionamento interpessoal, refere-se à capacidade de manter amizades, estar bem com a família, envolvimento em actividades sociais, relações sexuais e ser capaz de expressar e defender os próprios interesses; Tempo de lazer, capacidade para a realização de actividade física e de desfrutar um hobbie.
Certamente que haverá quem diga - Mas isso está patente na Vineland, certo? E não deixa de ser verdade. Inclusive a avaliação, seja do diagnóstico e do nível de funcionalidade nem precisa de instrumentos. Poderá ser realizada pelo próprio clinico em conjunto com a pessoa e a família (informadores). Além de que os instrumentos podem ser melhor ou pior aplicados por esta ou aquela pessoa que lhe pode sempre acrescentar um pouco da sua sensibilidade e experiência clínica. Contudo, volto a frisar que parece importante haver um instrumento de fácil aplicação e que ainda assim devolva uma informação de qualidade para informar o profissional de saúde a desenhar conjuntamente com a pessoa com Perturbação do Espectro do Autismo nível 1, um plano terapêutico mais adequado.
E por norma quando temos uma pessoa com uma Perturbação do Espectro do Autismo nível 1 nem sempre se sente a necessidade de usar a Vineland. Talvez possa ser uma crença que foi sendo construída de que que este instrumento está construído para as situações em que há um compromisso funcional, admito, Mas o certo é que muito consensualmente parece ser isto que acontece. E tendo em conta aquilo que se vai observando como sendo necessário de intervir junto das pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo nível 1. Sendo que para tal basta olhar para os números referentes ao nível de dependência e residência conjunta com os pais na vida adulta. Bem como em relação ao números referentes ao mercado de trabalho. Posto isto, parece importante acelerar ainda que com um sentido coerente.
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