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Foto do escritorpedrorodrigues

Também se vive no limite

Nem sempre assim parece, mas muitas vezes estamos e continuamos a viver no limite. Seja este um limite da nossa força, tolerância, bem estar, etc. São muitos os que parecem ter uma qualquer capacidade de mascarar esse modo de viver - no limite. As redes sociais e os filmes parecem ser disso exemplo e ao mesmo tempo um instrumento. Seja porque mascara ou porque procuramos transmitir o nosso ideal, essa comunicação pode induzir um viés acerca da nossa realidade. É assim na nossa vida pessoal e o mesmo também parece acontecer no autismo.

The Limits of my world [https://www.thelimitsofmyworld.com]é um documentário de Heather Cassano sobre a vida do seu irmão Brian. Ele é autista e o documentário procura mostrar de uma forma realista a sua vivência ao longo da vida. Ao principio parece ser um documentário igual a tantos outros já existentes e com orçamentos superiores e que passaram a séries e com números de audiência significativos a nível mundial. Mas quando começamos a ver The Limits of my world temos a estanha sensação de uma vida partilhada com aquela personagem. Seja porque somos autistas ou familiares de alguém autista, ou então somos técnicos que acompanhamos jovens adultos e adultos autistas.


Brian é autista não verbal com um défice cognitivo. Heather não teve uma ligação próxima do seu irmão na infância mas à medida do tempo passou a desenvolver uma maior proximidade, conhecimento e genuína relação com o seu irmão. A sua câmara mostra precisamente isso. Seja na forma mais espontânea ou inusitada de mostrar a realidade vivida pelo seu irmão. Mas também na tradução por vezes crua dos pensamentos e sentimentos. As vitórias, mesmo as pequenas vitórias que são frequentemente deixadas para segundo plano por muito, inclusive o próprio. Mas também as derrotas, pequenas, grandes e devastadoras, capazes de abalar qualquer um. E o sentimento de injustiça e incompreensão sentido no quotidiano quando as próprias Instituições que trabalham com estas pessoas parecem não conseguir ter em conta.


No autismo são várias as narrativas de todos aqueles envolvidos e a própria narrativa vai sofrendo mutações ao longo do desenvolvimento do próprio quadro de autismo e de como todos o passam a aceitar e ou a integrar no seu quotidiano complexo de relações. Não parece haver certos ou errados, apesar de haver espaços ocupados com esses sentimentos. A culpa dos pais que acaba de passar para a relação com os filhos. A zanga dos irmãos que não compreendem muitas das situações vividas. A sensação de se ter vivido uma vida ou parte importante dela traumatizada. Seja a do próprio autista mas também dos outros que consigo vão mantendo uma relação. E ainda assim aprender a aceitar que pode ser traumatizante e que isso não significa que se goste ou ame menos.


Os sentimentos vividos pela família e pelo próprio em relação a todo um conjunto de etapas fundamentais da vida, normalmente etapas de transição causadoras de maior ansiedade e receios próprios causam atropelos nas relações. Os pais e irmãos que querem muito ajudar o seu familiar a conseguir alcançar um determinado objectivo mas que nem sempre é o seu próprio mas sim o de alguém da família ou construído socialmente. Desejos que acabam por arrastar os próprios em avalanches de sofrimento e causar frustração na própria família. Será que ele vai conseguir trabalhar, viver autónomo e independente, casar, ter filhos, ser feliz, etc.?


Estas e outras questões são filmadas com tal impacto que sentimos que aquelas frases são um testemunho de uma realidade conhecida e com tonalidades diferentes da maneira como cada um de nós vive o seu limite, mas que o vive ainda assim. Não é apenas uma sobrevivência, como por vezes alguns de nós sente que é o seu viver. É também e apenas um viver. Não é apenas um conjunto de terapias para moldar um determinado comportamento e que capacita o próprio a alcançar determinados objectivos. É também um procurar compreender o próprio e ajudar o próprio nesse caminho de se conhecer e aprender a si mesmo.

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