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Foto do escritorpedrorodrigues

Mundo à justa

És um sonhador Pedro! É uma frase que frequentemente oiço. Também já me disseram que sou ingénuo e que não devia acreditar tão fortemente nas pessoas ou no Mundo. O que me faz pensar em quem deveria acreditar senão nas pessoas e no Mundo? Quanto ao facto de o fazer fortemente diria que é mais uma questão de estilo de cada um. O Mundo não é um lugar justo!, dizem-me frequentemente nas consultas. E não um sentimento dos tempos actuais. Seja na situação actual vivida de pandemia ou nos casos que acompanho com Perturbação do Espectro do Autismo, é algo constante. E também é algo de há mais tempo. As pessoas em sofrimento psicológico e principalmente as pessoas que sofrem ao longo de um maior período de tempo parecem ter menos confiança, seja nas pessoas mas também no Mundo. E isso deveria fazer-nos reflectir a todos um pouco. O certo é que não somos todos iguais e como tal as pessoas diferem do quão fortemente acreditam que, em geral, uma pessoa recebe aquilo que merece. Ou seja, aquilo que alguns investigadores referem como sendo o conjunto de diferenças individuais na crença geral num mundo justo. Ao que parece, o próprio Orson Welles disse uma vez, Nobody gets justice. People only get good luck or bad luck.”. E de uma perspectiva cientifica, parece não haver razão para supor que o Mundo seja geralmente justo. Em outras palavras, não parece haver evidência real de uma lei natural dentro do universo de que, em geral, as pessoas recebem o que merecem e merecem o que recebem. Mas o certo é que há pessoas que sentem acreditar que recebem o que merecem e outras que merecem o que recebem. Mas porquê, dirão alguns? Talvez porque a crença no mundo justo, possa ela própria ajudar a amortecer o stress ou o mal estar relacionado com a imprevisivilidade e as ameaças da vida. E ao acreditarmos que o mundo é justo, o futuro parece ser mais controlável se agirmos de acordo com os padrões aceites. E enquanto vou pensando nisto, não deixo de penar na forma como muitos dos meus clientes com Perturbação do Espectro do Autismo sentem a sua vida e a forma como pensam o Mundo e a crença que depositam no Outro. E pergunto-me, será que a visão de muitos deles pode querer significar que as pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo tendem a ser mais realistas? E que ironicamente veem as vitimas de forma mais justa do que as outras pessoas não autistas? Se por um lado podemos pensar nisso com base naquilo que conhecemos do seu processamento de informação. Por outro lado, também pode significar que as pessoas no Espectro do Autismo têm menor probabilidade de usarem estratégias para auto-regular os seus afectos negativos. Fazendo com que com as pessoas no Espectro do Autismo possam estar mais frequentemente associados a uma redução do seu bem-estar. O certo é que as pessoas no Espectro do Autismo parecem ter uma crença pessoal inferior de um mundo justo. Embora a crença geral num mundo justo se refira ao grau em que as pessoas acreditam que o mundo é geralmente um lugar justo, e a crença pessoal num mundo justo reflicta o grau em que acreditam que são tratados com justiça. E depois de tudo isto escrito e de pensar mais pausadamente na forma como muitas das pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo vivem desde sempre não sinto ser assim tão difícil, que a sua crença num mundo justo seja inferior às pessoas não autistas. Independentemente das características e do perfil de funcionamento de cada um de nós, será fundamental pensar, na forma como as pessoas com PEA ou outra condição psiquiátrica são tratadas ao longo da vida, seja na família, escola, locais de trabalho, sociedade em geral. E como tal não sei se as pessoas no Espectro do Autismo é que sentem que têm o que merecem e merecem o que têm. Talvez qualquer um de nós possa fazer a sua parte nesta equação, o que acha?


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