Monólogo. Mo.nó.lo.go. Nome masculino. Peça teatral em que fala um só actor. Acto de falar consigo próprio. Solilóquio. Discurso que não deixa oportunidade aos outros interlocutores de intervirem. É o que diz no dicionário.
Há uns tempos atrás a Rita Serra falou-me acerca deste projecto - Monólogos de mulheres autistas. [Primeiro vídeo: Monologues across the spectrum: Autistic experience of women: Joanna Grace] Senti que não precisava de ouvir mais para dizer - Que excelente ideia! E assim o fiz. Deixei a Rita falar sobre ele. E fiquei a escutar o solilóquio da Rita. E disse - Que excelente ideia!
E porquê todos este empolgamento? É uma coisa simples! Uma mulher autista a falar da sua vivência enquanto mulher autista. Uma mulher autista a falar da sua cosmovisão. E então? Há tantas pessoas a falar sobre autismo ultimamente? Parece que de repente todos se lembraram de falar sobre o autismo!
É verdade que hoje se fala mais de autismo do que há alguns anos atrás. Mas também é verdade que hoje se fala mais de autismo na primeira pessoa, pelo próprio. E como em muitas outras situações, também é verdade que há ainda poucas mulheres a falar sobre o autismo, sobre si, sobre o seu autismo.
É do conhecimento de alguns que ainda persiste esta ideia de que o autismo é uma condição que ocorre com uma maior prevalência no sexo masculino e com uma diferença muito grande comparado com o sexo feminino. Durante muito tempo foi falado 4 rapazes autistas para cada 1 rapariga autista. Ainda se faz essa referência. Mas já é mais habitual ouvir-se um intervalo mais curto, de 2 rapazes autistas para cada 1 rapariga autista. Mas apesar destas questões, que são importante, o autismo é muito mais do que isto. O autismo é principalmente a narrativa do próprio. E neste caso, a narrativa da própria.
E qual a diferença que estes monólogos podem fazer? E a quem? Provavelmente a todos. À própria mulher que fala sobre a sua vivência, a elabora e reelabora no seu repensar e reexperenciar. Mas também a todos aqueles que a ouvem. Às outras mulheres que se possam rever no seu monólogo, no seu sentir e pensar. Mas também a todos os outros que possam ouvi-la e aprender a pensar o autismo numa perspectiva mais abrangente e sem dúvida no feminino.
No monólogo, e na sua definição encontrada no dicionário, fico a pensar que o monólogo enquanto fala de um só actor, não significa que a pessoa esteja a falar sozinha. O monólogo da pessoa já foi um diálogo anterior com outra pessoa e também com os seus próprios pensamentos. Tal como o solilóquio enquanto acto de falar consigo próprio. Esse acto tem certamente muitas mais vozes do que apenas aquela que se houve. E quanto ao facto do monólogo ser um discurso que não deixa oportunidade aos outros interlocutores de intervirem, é algo bastante conhecido pelas pessoas autistas. Nomeadamente, é algo de que muitas pessoas autistas são acusadas. Talvez seja mesmo necessário interromper certos discursos que se vão fazendo e impor a nossa voz. E neste caso especifico a voz das mulheres autistas.
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