Não irei falar de interesses restritos no espectro do autismo. Ainda que o tema dos pássaros seja um tópico recorrente. A avaliação no autismo, seja no rastreio ou na atribuição do diagnóstico é fulcral para dar encaminhamento a um processo que irá acompanhar a pessoa ao longo da vida. O canário nas minas de carvão também o era, sabia?
Em tempo idos os mineiros usavam os canários em gaiolas para percorrerem as galerias dentro das minas de carvão. Os canários sendo mais sensíveis que as pessoas ao monóxido de carbono davam sinais assim que a presença deste gás se começava a tornar perigoso. Grande parte das vezes os mineiros salvavam a sua vida mas não a do canário que acabava na maioria das vezes por morrer.
No autismo continua-se a verificar um número de situações em que crianças em idade precoce são sinalizadas através da utilização de instrumentos de rastreio para o espectro do autismo. Nomeadamente o M-Chat, instrumento que a nossa colega Carla Almeida no PIN conhece sobejamente bem do seu doutoramento. Mesmo quando não são sinalizadas através deste instrumento mas a partir da avaliação clínica do pediatra continua a haver muitas crianças que não estão a realizar uma avaliação completa através de um conjunto de instrumentos aferidos e validados para esta área. Seja o ADI-R, entrevista para os pais e cuidadores e o ADOS-2 na observação junto da criança, jovem ou adulto. Para além de um conjunto de outros instrumentos, nomeadamente questionários de auto-preenchimento e depois mais tarde completado pela avaliação das funções cognitivas.
O diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo (PEA) pode perfeitamente ser realizado sem a utilização destes instrumentos referidos anteriormente. Mas a avaliação fica certamente mais completa através do uso dos mesmo. E o próprio delinear do processo de intervenção, da necessidade de encaminhamento para este ou outra especialidade (e..g., Terapia da Fala, Psicomotricidade, etc.) torna-se mais fácil.
Seja porque os profissionais que observam as crianças não se sentem à vontade neste rastreio das características da PEA ou por desconhecimento. O certo é que o processo de referenciação parece não estar a funcionar num conjunto significativo de situações. Ou seja, as crianças e as respectivas famílias não estão a ser encaminhadas para os especialistas e os centros de referência para realizar uma avaliação e intervenção adequadas.
Acrescento que este processo de referenciação no autismo se estende ao longo do desenvolvimento. Continuam a ser muitos os casos em que o processo de referenciação da adolescência para a vida adulta parece não funcionar. Se observarmos as próprias orientações da Direcção-Geral de Saúde para a saúde mental apresenta fragilidades nos dois pólos. Seja junto dos profissionais que acompanham os jovens mas também daqueles que depois recebem os adultos. A falha no processo de comunicação faz com que a função do canário se torne obsoleta. Para além dos canários, os mineiros e todos os demais ficam em risco.
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